quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Pica pau, o ecológico



Você sabia que o Pica-pau foi considerado extinto?
Pois é. A espécie Campephilus principalis foi considerada extinta há décadas, e ao saber disso,Walter Lantz teria nomeado seu mais famoso desenho em homenagem a esta espécie, como lembrete pela perda que a humanidade causara no ambiente.

Surpresa das surpeesas, em 2004 um grupo de pesquisadores disse ter obtido provas de que a espécie ainda persiste em área remotas do centro-leste norteamericano. Há uma enorme polêmica sobre a substancialidade das provas (um bom artigo para começar a se envolver na discussão é este: http://www.sciencemag.org/content/early/2005/04/28/science.1114103.full.pdf). Não sei se há um "Fundo Pica-pau pela conservação", mas seria genial que os herdeiros de Lantz ajudassem a proteger a espécie que os fez ricos.



Quer dizer que o mais politicamente incorreto dos desenhos nasceu de uma preoupação ecológica? O anárquico Pica pau é um ambientalista?

Exato. E não só isso. Em comparação com seus pares da Warner e Disney da época, o Pica-pau é ecologicamente engajado até a medula. Não obstante os desenhos onde os predadores eram os vilões (ursos eram as maiores vítimas, mas jacarés e aves de rapina também sofriam nas mãos do esperto e franzino Pica-pau, no clássico embate de davi contra Golias comum a tantos desenhos), os roteiristas atacavam cientistas com pesquisas invasivas (comuns na época dos primeiros documentários de natureza, tão interferentes quanto uma caçada), taxidermistas, lenhadores, artesãos de relógios cuco (tem coisa mais cruel do que um pássaro empalhado dar as horas?), observadores de pássaros e falsos ecoturistas, caçadores de búfalos, de baleias... a lista é incrivelmente extensa.

Sim, o desenho de suas manhãs tentou te ensinar valores ecológicos antes de aprenderes a escrever.

E as pessoas se questionam o tempo todo se devemos ser chatos e passar lições o tempo todo. Isso acontece! A diferença entre o discurso pentelho do capitão Planeta e o Pica pau é que o segundo é mil vezes mais divertido e a lição é sutil. O mesmo acontece com a crítica social em "Chaves".

Outro dia, em uma típica corrida armamentista, Quico e Chiquinha ficavam gritando na orelha de seus respectivos pais para jogarem mais e mais moedas para subornarem o poço de desejos e mais e mais tratores atropelarem o outro. E Chaves diz: "-Será que não dá pra pararem de desperdiçar moedas com tratores e desejarem que eu possa almoçar todos os dias?"

E todo mundo acha Roberto Bolaños só um palhaço... E nunca prestaram atenção no moral do seu madruga, no capitalismo com coração do seu Barriga, nas críticas ao crime organizado do Tripa Seca, nas espetadas no imperialismo quando aparecia o SuperSam unindo-se ao Chapolin Colorado.

E agora os desenhos pararam de dar lições, e a juventude se perdeu? Não. Assisti dia desses um episódio de Ben 10, aquele desenho feito só para vender brinquedos que todo mundo critica sem lembrar que essa é uma das mais antigas técnicas de marketing infantil, onde não só o episódio inteiro é sobre o protagonista e seus amigos tentanto evitar uma guerra entre dois povos só diferentes pela cor (azuis contra vermelhos) e cujas ideias se completavam sempre quando eles se uniam, como eles falham em evitar a guerra, deixam a situação ainda pior do que quando chegaram e os generais assumem que só fazem guerra para que o povo se esqueça dos problemas verdadeiros que eles tem que enfrentar, e nunca se rebelem contra os governantes que não fazem nada por eles. É mais fácil colocar a culpa na guerra.

É horrivelmente pessimista. E é o desenho que seu filho assiste e aprende. Eu diria que algo deste tipo supera até mesmo a moral que toda criança pulava e ia fazer coisa mais interessante no final de He-Man (com a nova ortografia esse hífen ainda existe?). Preciso ainda citar a genialidade dos estúdios da Pixar, que merecidamente tomaram de assalto a Disney e aposentaram a era das continuações das continuações do subprodutos dos clássicos antigos. Deixem o Rei Leão em paz. Viva Wall-E (lixo e sedentarismo), Procurando Nemo (relação pai-e-filho, repressão familiar e desejo de liberdade) e Brave (que eu nem sei do que tratará, e já nasceu perfeito)!



Claro, para cada sacada em Ben 10, temos mil desenhos das Bratz, filmes dos Transformers (a coisa mais imbecil em que Spielberg já pos a mão) ou episódios de Hot Wheels. Por sorte, existe o Peixonauta, os Backyardigans e a TV Cultura.

Tudo isso para lembrar que a infância de hoje não está pior servida de TV do que a sua, ó trintão. O que falta a ela é pisar na Terra, e isso é com você, bicho. Na sua época, sua mãe te largava no terreno baldio vizinho. Hoje, essa parte precisa da sua ajuda.

E se prepare, você vai precisar fazer o vilão alienígena da vez com a mesma imaginação com que fingia ser o Esqueleto.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Pintou um Clima




Acabou a conferência de Durban e parece existir certo otimismo pelo fato de que as conclusões pelo menos contaram com apoio dos dois emissores de gases de efeito estufo do planeta, a China e os EUA.

Não preciso discutir muito aprofundadamente sobre tudo que foi dito, então resolvi dedicar a postagem àqueles que se acostumaram a dizer que o clima não está mudando e que controlar emissões de gases de efeito estufa é parte de um plano maquiavélico dos países industrializados segurarem o desenvolvimento dos países pobres.

Tem gente que pensa assim? Tem, e não sem uma parcela de razão. Controlar emissões é uma forma de encarecer a produção industrial e um país pode alegar que não comprará nada de um país poluidor pequeno, impedindo-o de exportar mais. DÁ para impedir o desenvolvimento de países com estas ferramentas.

O que em geral se esquece é que seus pais se lembram de quando São Paulo era a Terra da Garoa, de quando nevou no Itatiaia e o mosquito da dengue não conseguia sobreviver nas latitudes abaixo do RJ. O clima está mudando. e não é para melhor. A humanidade já tirou zilhões de toneladas de carbono que a natureza sabiamente enterrou sob camadas infinitas de rocha e os jogou no céu. Já tirou camadas imensas de cobertura vegetal dos solos e igualmente as queimou.

Sério que tem quem acha que isso não faz diferença no equilíbrio climático do planeta?

É mais comum ver este pensamento entre gente de humanas, que costuma enxergar tudo pelo filtro da justiça social, da briga de classes, do marxismo x capitalismo e por aí vai. É gente que nunca leu ou não quis entender livros como o genial "Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres", de Leonardo Boff, que retrata o papel da destruição ambiental no processo de opressão social. Ou ainda "Pálido ponto azul", do saudoso Carl Sagan, que nos lembra da fragilidade de nosso planeta.

Os exemplos de mudança climática são imensos. Furacões, secas, enchentes são as mais evidentes, mas pequenas mudanças climáticas como o aumento de meio grau centígrado torna possível a insetos avançarem sobre áreas antes livres deles, levando novas formas de destruição de lavouras ou epidemias de doenças após alguns anos.

Sério que tem quem ache que isso tudo é um ciclo natural? Que a Terra esfria e esquenta normalmente e isso não é culpa nossa? Claro que tem, gente que não sabe contar tempo geológico para saber que uma mudança climática de poucos graus leva alguns poucos milhares de anos (O que é rápido em se tratando de eras). As mudanças climáticas que hoje sofremos podem ser acompanhadas em pouco mais de cem anos, coincidindo com o início do uso sistemático e incontrolável de combustíveis fósseis. Coincidindo? Não.

A conferência de Durban é uma grata surpresa, embora ainda sem resultados práticos, que pode nos mostrar que está na hora de pararmos de ver o problema como país contra país e sim de humanos tentando manter o planeta habitável em todas as suas partes.

Garanto que se você morasse no arquipélago de Tuvalu estaria muito mais feliz com a possibilidade de começarem a cuidar disso!